Pedido de certificação do Quilombo de Vó Dôla é enviado à Fundação Palmares
O documento destinado à Fundação Palmares, já foi assinado pela prefeita.
A prefeita Sheila Lemos, assinou um ofício destinado à Fundação Palmares, em que solicita oficialmente a certificação da Comunidade do Beco de Vó Dôla como o primeiro quilombo urbano de Vitória da Conquista. Esse foi o último ato que cabia ao Governo Municipal nesse processo. “Vó Dôla realizou um trabalho muito bonito na comunidade e reconhecemos isso”, disse a prefeita.
“Com esse ofício, o Município avaliza todo o trâmite que foi feito e pleiteia, agora, que a Fundação Palmares avalie os termos de referência encaminhados e reconheça a Comunidade do Beco de Vó Dôla como quilombo urbano”, explicou o coordenador municipal de Políticas de Igualdade Racial, Ricardo Alves.
Agora cabe, ao Governo Municipal e aos próprios integrantes do território, situado no bairro Pedrinhas, aguardar que a Fundação Palmares envie a resposta oficial. “O processo atendeu a todos os requisitos legais que a Fundação exige. É um documento robusto e bem fundamentado. Uma vez que o próprio município assina e reconhece o processo de certificação, a Fundação não costuma questionar, pois o processo é autodeclaratório”, afirma o coordenador.
Apoio ao reconhecimento
Ricardo Alves reforça que, desde que o processo de reconhecimento foi iniciado, em 2022, tendo à frente a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Semdes) – ainda sob a gestão da então coordenadora municipal de Políticas de Igualdade Racial, Olinda Pereira –, a Prefeitura disponibilizou o apoio necessário ao pleito dos descendentes de Vó Dôla. “O Governo Municipal deu total assessoria e apoio, disponibilizando estrutura para oficinas e técnicos para acompanhar o processo”, atesta Alves.
Para que esse apoio fosse disponibilizado, foi necessário que, antes, a própria comunidade se autorreconhecesse como quilombo urbano. É o que explica Laiz Gonçalves, neta de Vó Dôla e uma das articuladoras do processo de certificação. “Se a comunidade não se autorreconhecer, não acontece o reconhecimento como quilombo”, diz Laiz. “Isso significa que o povo do Quilombo de Vó Dôla resiste e continuará resistindo para que seu legado, e o de tantas outras Vós Dôlas que existem em Conquista, resistam. Somos sempre resistência”, defende a ativista.
Laiz acredita que o envio do documento municipal à Fundação Palmares é um passo para uma reparação histórica. “O povo de Conquista tem uma grande dívida com essa mulher, que sempre cuidou dos outros para poder sustentar os seus. Ela abasteceu muitas construções com pedra quebrada pra se fazer brita, e com água, que foi colocada em suas casas e em grandes hotéis de Conquista”, relata.
Materiais fazem parte do legado de Vó Dôla (na foto)
Reparação histórica
Laís faz referência a uma das atividades desempenhadas por Maria Petronília dos Santos, conhecida por todos como Vó Dôla, nascida em 29 de junho de 1925 e falecida em 29 de maio de 2006, aos 83 anos – dois a mais do que constava oficialmente em seus documentos pessoais. “Segundo ela, a idade no documento estava errada, pois ela foi registrada quando foi se casar”, justifica Laís, cuja mãe, Fátima de Xangô, era filha caçula de Vó Dôla.
Assim como vários de seus contemporâneos, a matriarca do bairro Pedrinhas costumava quebrar pedras e vender o material para ser utilizado em construções. Outras atividades comuns entre os membros da comunidade, e devidamente registradas durante o processo de reconhecimento, eram a colheita de café em fazendas da região, o carregamento de água para residências e estabelecimentos comerciais e o trabalho doméstico em casas de moradores de outros bairros. Outros aspectos culturais eram a dedicação ao samba de roda e aos antigos carnavais conquistenses, a religiosidade fundamentada em matrizes africanas e as romarias à igreja de Bom Jesus da Lapa e à Gruta da Mangabeira, em Ituaçu.
Reuniões no Beco de Vó Dôla…
…foram realizadas, como parte do processo de reconhecimento
“Queremos futuro mais inclusivo e justo”, diz prefeita
Atualmente, Vitória da Conquista abriga 32 comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Palmares – todas localizadas na zona rural. Segundo informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), incluídas no Censo de 2022, o município possui 12.057 habitantes vivendo em regiões quilombolas, o que o inclui na lista das dez maiores populações quilombolas do país. O mesmo levantamento do IBGE informou que, em todo o Brasil, a população quilombola é de 1.327.802 pessoas.
Com a provável certificação por parte da Fundação Palmares, o Quilombo de Vó Dôla seria oficialmente o 33º quilombo conquistense – e, portanto, o primeiro situado na zona urbana do município.
Segundo a prefeita Sheila Lemos, a presença maciça de povos tradicionais em Vitória da Conquista é algo prioritário para a Prefeitura. “Temos realizado uma série de políticas públicas, a exemplo da Coordenação de Promoção da Igualdade Racial, que trata das questões ligadas aos povos tradicionais, a criação do Centro Integrado dos Direitos Humanos, e as políticas transversais que passam por todas as secretarias do Governo Municipal, como Saúde, Educação e Desenvolvimento Social”, informou a gestora, na mesma postagem em que anunciou a assinatura do documento sobre a Comunidade do Beco de Vó Dôla.
“Vamos continuar investindo em políticas públicas específicas e cuidando para garantir seus direitos fundamentais. Juntos, avançaremos na construção de um futuro mais inclusivo e justo”, concluiu Sheila.
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